A Cultura da Concentração – Parte 2 – W.Q.Judge
Há mais de um ano que enviei a Parte 1 ao Editor do PATH. Desde então, ouvi dizer que alguns estudantes expressaram o desejo de ler a Parte 2, esquecendo-se de notar, talvez, que o primeiro trabalho estava completo em si mesmo e, se estudado, seguido da prática séria, teria levado a resultados benéficos. Não era necessário escrever o No 2; e aos vários estudantes que, tão logo após a leitura do primeiro, pediram o segundo, eu digo francamente que vocês se deixaram levar porque uma sequência foi mencionada e vocês não devem ter estudado o primeiro; além do mais, duvido muito que vocês serão beneficiados por esse mais do que pelo outro.
O sucesso na cultura de concentração não é para aquele que a tenta esporadicamente. É uma coisa que flui de “uma posição firme assumida em relação à finalidade em vista, e mantida incessantemente”. Estudantes do século XIX são demasiadamente suscetíveis a pensar que o sucesso no ocultismo pode ser alcançado da mesma forma que se alcança sucesso na escola ou na faculdade, lendo e aprendendo palavras impressas. Um conhecimento completo de tudo o que já foi escrito sobre concentração não conferirá nenhum poder na prática daquilo sobre o qual eu trato. O mero conhecimento livresco é zombado nessa escola tanto quanto pelo bronco; não que eu ache que o conhecimento de livro deva ser evitado, mas esse tipo de aquisição sem a concentração é tão inútil quanto a fé sem obras. É chamado em alguns lugares, creio eu, de “mero conhecimento ocular”. De fato é assim; e tal é o tipo de cultura mais considerado em nossos tempos corrompidos.
Ao iniciar esses artigos, a verdadeira prática foi chamada de Raja Yoga. Ela descarta aqueles movimentos físicos, posturas e métodos relacionados unicamente à personalidade atual, e direciona o estudante para a virtude e para o altruísmo como as bases a partir das quais começar. Tanto se tem dito durante os últimos 1800 anos sobre os Rosacruzes, os Adeptos Egípcios, os Mestres Secretos, a Cabala e os maravilhosos livros mágicos que os estudantes sem uma orientação, atraídos por esses assuntos, pedem informações e procuram em vão a entrada para o templo do aprendizado que almejam, porque dizem que as regras da virtude se destinam às crianças e às escolas dominicais, mas não a eles. E, consequentemente, encontramos centenas de livros em todas as línguas da Europa tratando de ritos, cerimônias, invocações e outras coisas obscuras que não levarão a nada a não ser a perda de tempo e de dinheiro. Mas poucos desses autores tinham algo a não ser “mero conhecimento ocular”. É verdade que eles têm às vezes uma reputação, mas é apenas aquela concedida a um ignorante por aqueles que são mais ignorantes. O assim chamado grande homem, sabendo quão fatal seria para a reputação falar quão pequeno é seu conhecimento prático, tagarela sobre “projeções e elementais”, “pedra e elixir filosofal”, mas discretamente esconde de seus leitores a escassez de suas aquisições e a insegurança de seu próprio estado mental. Que saiba o inquiridor, de uma vez por todas, que as virtudes não podem ser descartadas nem ignoradas; é preciso que sejam feitas parte da nossa vida, e sua base filosófica deve ser compreendida.
Mas pode-se perguntar se, na cultura da concentração, seremos bem-sucedidos apenas pela prática da virtude. A resposta é não, não nessa vida, mas talvez um dia em uma vida posterior. A vida da virtude acumula muito mérito; esse mérito fará com que, em algum momento, se nasça em uma família sábia onde a verdadeira prática da concentração possa possivelmente começar; ou possa fazer com que se nasça em uma família de devotos ou de pessoas muito avançadas no Caminho, conforme dito no Bhagavad-Gita. Mas tal nascimento, diz Krishna, é difícil de se obter; daí que somente as virtudes não levarão sempre ao nosso objetivo em um prazo curto.
Devemos decidir por uma vida de constante trabalho nesse sentido. Os preguiçosos ou aqueles que pedem prazer podem muito bem desistir no limiar e contentar-se com os caminhos agradáveis traçados para aqueles que “temem a Deus e honram o Rei”. Imensos campos de investigação e de experimentação devem ser atravessados; perigos impensáveis e forças desconhecidas devem ser enfrentados; e tudo deve ser superado, porque nessa batalha não se pede nem se dá misericórdia. É preciso encontrar e apreender grandes reservas de conhecimento. Não se conquista o reino dos céus de graça; ele deve ser tomado pela violência. E a única maneira em que podemos obter a vontade e o poder para assim apreender e segurar é, por um lado, adquirindo as virtudes e, por outro lado, compreendendo detalhadamente a nós mesmos. Um dia começaremos a ver por que não se pode ignorar um pensamento passageiro, não se pode perder uma única impressão. Podemos ver que isso não é uma tarefa simples. É uma obra gigantesca. Você já refletiu que a mera visão passageira de uma imagem, ou uma única palavra perdida instantaneamente na correria do mundo, pode ser a base de um sonho que envenenará a noite e reagirá sobre o cérebro no dia seguinte? Cada um deve ser examinado. Se você não o tiver notado, então quando acordar no dia seguinte terá que relembrar cada palavra e circunstância do dia anterior, procurando, como o astrônomo pelo espaço, por aquela palavra perdida. E, da mesma forma, sem uma razão tão especial, você deve aprender a poder retroceder assim em seus dias, de modo a rever cuidadosamente e em detalhes tudo o que aconteceu, tudo o que você permitiu passar pelo cérebro. Isso é um assunto fácil?
Mas voltemos por um momento aos adeptos impostores, aos pretensos mestres, sejam eles bem-intencionados ou o contrário. Tomemos Eliphas Lévi, que escreveu tantas coisas boas, e cujos livros contêm tantas dicas misteriosas. A sua própria boca o condena. Com um grande espetáculo, ele conta da elevação da sombra de Apolônio. Semanas antes, todos os tipos de preparativos tiveram que ser feitos e, na noite decisiva, performances absurdas e necromânticas foram realizadas. Qual foi o resultado? Porque só apareceu a assim chamada sombra de Apolônio, por alguns instantes, e Lévi disse que nunca tentariam novamente. Qualquer bom médium daqueles dias poderia chamar a sombra de Apolônio sem preparo, e se Lévi fosse um Adepto ele poderia ter visto o morto com a mesma facilidade com que se virou para sua foto em um livro. Por essas tentativas esporádicas e preparativos externos, nada é de fato ganho a não ser dano para aqueles que assim se entregam. E a brincadeira insensata dos teosofistas americanos com práticas dos iogues da Índia, que não são compreendidas nem um oitavo e que em si mesmas são inadequadas, levará a resultados muito piores do que a apócrifa tática registrada por Eliphas Lévi.
Como temos que lidar com a nossa atual mente ocidental, totalmente sem uso como ela é para essas coisas e sobrecarregada com treinamento falso e lógica ainda mais falsa, devemos começar de onde estamos, devemos examinar nossas posses atuais e crescer para conhecer nossos próprios poderes e maquinário mental atuais. Feito isso, podemos continuar a nos ver no caminho que proporcionará o melhor resultado.
RAMATIRTHA (WQJ)
Path, fevereiro 1890