O Dogmatismo na Teosofia – W.Q.Judge
A Sociedade Teosófica foi fundada para eliminar o dogmatismo. Esse é um dos propósitos do seu primeiro objetivo – a Fraternidade Universal. E o Col. H.S. Olcott, no seu discurso inaugural em 1875, no Mott Memorial Hall, Nova Iorque, disse que tal era o objetivo em vista, citando o mau efeito que a intolerância tinha causado no passado. Aquele discurso foi lido por Mme. H.P. Blavatsky antes da sua apresentação, ou seu conteúdo lhe foi comunicado, de forma que tinha sua aprovação, porque ela estava presente quando foi proferido.
Em “A Chave para a Teosofia”, na “Conclusão”, H.P.B. alude novamente a esse assunto e expressa a esperança de que a Sociedade não se torne, após a sua morte, dogmática ou cristalizada em algum aspecto do pensamento ou da filosofia, mas que possa permanecer livre e aberta, com os seus membros sábios e altruístas. E em todos os seus escritos e observações, em particular ou publicamente, ela reiterou constantemente essa ideia. Quanto às suas declarações em particular, o escritor tem provas diretas.
Para que o nosso esforço seja bem-sucedido, temos de evitar o dogmatismo na teosofia tanto como em qualquer outra coisa, porque a partir do momento em que dogmatizamos e insistimos na nossa interpretação da teosofia, perdemos de vista a [noção de] Fraternidade Universal e semeamos as sementes de futuros problemas.
É muito provável que os membros da Sociedade insistam que haja uma certa ortodoxia nas nossas fileiras. Já o estão fazendo aqui e ali, e isto é uma nota de aviso para chamar a sua atenção para o perigo. Não há ortodoxia na nossa Sociedade. Ainda que nove décimos dos membros acreditem na reencarnação, no Carma, na constituição sétupla, e em todo o restante, e ainda que seus proeminentes estejam empenhados em promover essas doutrinas bem como outras, as fileiras da Sociedade Teosófica devem ser sempre mantidas abertas, e a ninguém deve ser declarado que não é ortodoxo ou não é um bom teosofista porque não acredita nessas doutrinas. Tudo o que se pede a qualquer um é que adira à Fraternidade Universal e à sua prática na busca da verdade. Porque os esforços daqueles que assim promulgam ideias específicas são feitos sob anuência do segundo objetivo da Sociedade, o qual qualquer um é livre para seguir ou para se recusar a seguir, conforme achar conveniente. Pode-se negar – de forma não dogmática – a reencarnação e outras doutrinas, ou afirmar a crença num Deus pessoal ou impessoal e, ainda assim, ser um bom membro da Sociedade, desde que a Fraternidade Universal seja aderida e posta em prática.
Se um membro diz que deve conceber um Deus ou que não pode acreditar na reencarnação, ninguém deve condenar ou fazer comparações, ou apontar para os escritos de H.P.B. ou de qualquer outra pessoa para mostrar que tal membro não é teosófico. As maiores mentes da Terra estão intrigadas com grandes ideias como essas e, no entanto, sustentando-as, podem ainda procurar a verdade com os outros num perfeito espírito de tolerância.
Mas, ao mesmo tempo, é óbvio que entrar na Sociedade e depois, sob o nosso apelo de tolerância, afirmar que a teosofia não deve ser estudada, que o grande corpo de pensamento e filosofia oferecido na nossa literatura não deve ser investigado, não é teosófico, pouco prático e absurdo, pois anularia o próprio objetivo da nossa organização; é um dogmatismo que flui da negação e da indiferença. Devemos estudar a filosofia e as doutrinas que nos são oferecidas antes de estarmos em posição de julgar e dizer que não são verdadeiras ou que deverão ser rejeitadas. Julgar ou rejeitar antes da averiguação é próprio das mentes pequenas ou dos dogmáticos preconceituosos.
E como o grande corpo de filosofia, ciência e ética oferecido por H.P. Blavatsky e seus professores tem sobre ele o selo da pesquisa, da razoabilidade, da antiguidade e da sabedoria, exige a nossa primeira e melhor atenção para que possamos concluir com aptidão a sua aceitação ou rejeição.
Assim, então, um membro da Sociedade, não importa quão alta ou baixa seja a sua posição nas suas fileiras, tem o direito de promulgar todas as ideias filosóficas e éticas encontradas na nossa literatura com a melhor capacidade fruída, e mais ninguém tem o direito de se opor, contanto que tal promulgação seja acompanhada por uma afirmação clara de que não é autorizada ou tornada ortodoxa por qualquer declaração do órgão corporativo da S.T. Nossa Sociedade deve ser mantida livre e aberta, não importa se, porque nos recusamos a formular crenças como Sociedade, permaneçamos em número reduzido, pois podemos sempre ser fortes na influência.
WILLIAM Q. JUDGE
Path, janeiro 1892