Os Invólucros da Alma – W.Q.Judge
No meu último artigo, “Mesmerismo“, cheguei ao ponto em que descobrimos que o homem mortal interno tem vários invólucros através dos quais ele consegue contato com a Natureza, sentindo seus movimentos e mostrando em troca seus próprios poderes e funções. É uma doutrina tão antiga como qualquer Escola Esotérica agora ativa, e bem mais antiga de que os institutos científicos modernos; entendê-la é absolutamente necessário se quisermos obter uma compreensão adequada do verdadeiro mesmerismo.
Em vez de olhar o ser humano como aquilo que vemos, ele deve ser considerado como um ser totalmente diferente, funcionando e percebendo de uma forma bastante peculiar a si mesmo, e sendo obrigado a traduzir cada impressão externa, bem como as que vêm de dentro, de uma língua para outra, ou seja, de imagens para palavras, sinais e atos, ou vice-versa. Esta afirmação é vaga, admito, mas ainda assim é verdadeira. A imprecisão surge das dificuldades de uma linguagem que, até agora, só tratou superficialmente desses assuntos e cujo desenvolvimento tem prosseguido em uma civilização totalmente materialista. O homem é uma Alma, e como tal ele está no meio de coisas materiais. Essa Alma não só está a caminho de ascender por si mesma mas, ao mesmo tempo, é compelida a elaborar, refinar, purificar e aperfeiçoar a – assim chamada – matéria bruta, na qual é forçada a viver. Pois embora chamemos de “matéria” os estágios menos finos da substância, ela é, no entanto, composta de vidas que têm nelas a potencialidade de se tornarem Almas num futuro extremamente distante; e sendo a própria Alma uma vida composta de almas menores, ela está sob a necessidade fraterna de esperar, nos vínculos da matéria, o tempo suficiente para dar a essa última o impulso correto ao longo do caminho da perfeição.
Assim, durante os longos anos que se passaram desde que a atual evolução iniciou nesse sistema solar, a Alma construiu para seu próprio uso vários invólucros, desde os muito finos, próximos a seu próprio ser essencial, até aqueles mais remotos, terminando com o físico externo, e aquele que é o mais ilusório de todos, embora parecendo de fora ser o verdadeiramente real. Esses invólucros são necessários para que a Alma possa conhecer ou agir. Pois ela não pode, por si só, compreender a Natureza, mas transforma instantaneamente todas as sensações e ideias por meio dos diferentes invólucros, até que no processo ela tenha dirigido o corpo embaixo ou obtido ela mesma a experiência em cima. Com isto quero dizer que qualquer Alma que inicia tem que passar através dos vários invólucros, cada um relatando, por assim dizer, para o próximo abaixo dele; e da mesma forma eles relatam de baixo para cima no caso de sensações de fenômenos naturais e impressões do exterior. Nos inícios da evolução e por todos seus estágios, isso levou quantidades consideráveis de tempo solar, mas nesse momento da marcha do sistema ao longo da linha do crescimento, requer uma duração tão infinitésima curta que temos razão em chamá-la de instantânea em todos os casos de pessoas normais e equilibradas. Existem, é claro, exemplos em que uma duração mais longa é usada em consequência da ação mais lenta de um dos invólucros.
O número dos invólucros da Alma claramente definido é sete, mas as subdivisões de cada um elevam o número aparente muito mais. Grosso modo, cada um se divide em sete, e cada um em cada conjunto de sete participa da natureza de sua própria classe. Por isso, pode-se dizer que existem quarenta e nove invólucros passíveis de classificação.
O corpo físico pode ser reconhecido como um invólucro, e as subdivisões nele existentes são tais como pele, sangue, nervos, ossos, carne, membrana mucosa etc.
O corpo astral é outro, mas não é tão facilmente reconhecido pelos homens de hoje. Ele também tem suas próprias subdivisões, correspondendo em parte às do corpo físico. Mas estando um nível mais elevado que esse último, ele inclui em uma de suas próprias subdivisões várias das do corpo. Por exemplo, as sensações superficiais de sangue, pele, carne e membranas mucosas serão incluídas numa só das subdivisões astrais.
E exatamente neste ponto que as Escolas Esotéricas divergem e parecem contradizer a patologia e fisiologia modernas. Porque a escola moderna admite apenas a ação dos nervos ao longo da pele e da mucosa e na carne, como receptores e transmissores de sensações. Parece ser assim, mas os fatos internamente são diferentes, ou melhor, mais numerosos, levando a conclusões adicionais. Também entramos em conflito com o século XIX na questão do sangue. Dizemos que as células sanguíneas e o fluido em que flutuam recebem e transmitem a sensação.
Cada subdivisão entre os invólucros físicos desempenha não apenas o dever de receber e transmitir sensações, mas também tem o poder de reter uma memória delas que é registrada no gânglio apropriado do corpo, e continuamente, a partir dali, implantada no centro correspondente de sensação e ação no corpo astral. Ao mesmo tempo, o cérebro físico tem sempre o poder, o que é um fato comum, de coletar todas as sensações e impressões físicas.
Tendo delineado tudo isso – sem parar para discutir, o que terminaria em nada sem que demonstrações físicas fossem acrescentadas – o próximo passo é este: o homem inferior que, por assim dizer, coleta para uso da Alma todas as experiências abaixo dela, pode à vontade quando treinado, ou involuntariamente, quando forçado por processos ou por acidente ou nascimento anormal, residir nas sensações e impressões de um ou de vários invólucros do corpo físico ou astral.
Se treinado, não haverá ilusões, ou qualquer ilusão temporária será facilmente dispersa. Se não treinado, a ilusão andará de braço dado com as sensações. Se adoentado ou forçado, os atos externos podem ser realizados corretamente, mas a inteligência livre está ausente, e todos os delírios e ilusões de estados hipnóticos e mesméricos aparecem.
Se o homem inferior interno estiver atuando entre as sensações – ou planos, se você preferir – de algum sentido ou centro astral, então a clarividência ou clariaudiência se instala, porque ele estará transferindo para o cérebro aquelas impressões procedentes de planos similares em qualquer sentido.
E quando a isto se acrescenta um toque parcial de algumas subdivisões físicas menores dos invólucros, a ilusão se torna mais completa, porque a experiência de um único conjunto de células é tomada pelo todo e relatada, por meio do cérebro, na linguagem usada por um ser normal. De fato, as combinações possíveis são tão numerosas nesse departamento que eu apenas mencionei algumas a título de exemplo.
É essa possibilidade do homem inferior interno estar ligado a um ou mais invólucros, e desconectado de todos os outros, que levou uma das escolas francesas de hipnotizadores a concluir que cada homem é um conjunto de personalidades, cada uma completa em si mesma. Os pontos de vista acima mencionados não são destruídos pelo fato, conforme observado em Paris e em Nancy, que o sujeito no estado hipnótico No2 nada sabe sobre o estado No1 porque cada pessoa normal, quando age normalmente, combina todos os vários conjuntos de sensações, experiências e lembranças em um só todo, a somatória de todos, a qual não é identificável como, qualquer um deles, diferente dos demais.
É também preciso lembrar que cada pessoa seguiu, em vidas anteriores, esse ou aquele curso de ação, que treinou e desenvolveu esse ou aquele invólucro da Alma. E, embora na morte muitos deles sejam dissolvidos como conjuntos inteiros, não se perde para o ser reencarnante o efeito de tal desenvolvimento anteriormente perseguido. É preservado através das misteriosas leis que guiam os átomos quando eles se reúnem para o nascimento de uma nova casa pessoal a ser ocupada pela Alma que retorna. É sabido que os átomos – físicos e astrais – passaram por todo tipo de treinamento. Quando a Alma está reencarnando, ela atrai para si aqueles átomos físicos e astrais que são o mais possível semelhantes à sua antiga experiência. Ela frequentemente recupera um pouco da matéria idêntica que usou na sua última vida. E se os sentidos astrais receberam na existência anterior na Terra grande atenção e desenvolvimento, então nascerá um médium ou um verdadeiro vidente ou sábio. Qual, dependerá da equalização das forças da vida anterior. Por exemplo, alguém que em outra encarnação participava integralmente do desenvolvimento psíquico sem filosofia, ou cometeu outros erros, nascerá, talvez, como um médium irresponsável; outro, novamente, da mesma classe, surge como um clarividente parcial totalmente indigno de confiança, e assim por diante, ad infinitum.
É afirmado desde tempos antigos que um nascimento em uma família de sábios devotos e verdadeiros sábios é muito difícil de ser alcançado. Essa dificuldade pode ser gradualmente superada pelo estudo filosófico e pelo esforço altruísta para outros, juntamente com a devoção ao Self Superior perseguido por muitas vidas. Qualquer outro tipo de prática leva apenas a um desnorteamento adicional.
WILLIAM Q. JUDGE
Lucifer, Junho 1892